segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Carecadas na Casa Pia:

Assim que qualquer aluno entrava na Casa Pia era de imediato submetido a uma completa desinfecção corporal e indivudual. Quatro ou cinco alunos mais velhos e já muito experientes rodeavam o novato, tiravam-lhe toda a roupa sem qualquer pudor. Normalmente isto era feito num claustro onde havia perto uma casa da banho com chuveiros. A casa de banho não era utilisada neste caso. Uma mangueira vinda de lá resolvia o problema. O novato era o centro das atenções não só dos que íam executar o trabalho de limpeza como o da assistência. Quero dizer, todos os outros alunos eram espectadores atentos. Era um autêntico circo montado. Mas o que é que despertava tanta atenção neste ritual? Nem sequer éramos obrigados a assitir. O que acontece é que todos nós já tinhamos sido publicamente humilhados anteriormente. Era a nossa vez de nos tornarmos espectadores. E sentíamos prazer nisto? Não. Nem tanto, embora um ou outro manifestasse o seu agrado. Mas havia outras ocasiões em que situações destas se tornavam em pura histeria. A cerimónia da primeira vez era diferente. Era mais silenciosa. O novato era escovado de alto a baixo. Bem esfregado. Havia alguns que vinham da rua onde sempre viveram que traziam no corpo autenticas porcarias que nem com pedra pomus se conseguia tirar. Haviam muitos que eram submetidos a várias sessões de limpeza. Mas havia um momento de excepção. Era a carecada. Normalmente quase todos traziam fartas cabeleiras. Quanto maior fossem os cabelos, maior era a satisfação da plateia. Aqui a malta gritava. Não tanto contra o novato, mas sim contra a humilhação por que todos passavam. Creio que a raiva de ter sido 'pelado' sem autorização nos fazia gritar. Era essa raiva que nós expressavamos. Ainda hoje uso o cabelo muito curto. Foi um hábito que me ficou para sempre.

Sem comentários:

Enviar um comentário