terça-feira, 6 de outubro de 2009

Como eu 'Gamava' Comida na Casa Pia:

Porque dentro do Asilo Maria Pia todos andavam com fome, e penso que se passava o mesmo nos outros asilos da Casa Pia, havia em nós uma constante procura de alimentos. Eram utilizadas as mais variadas formas de angariar comida, fosse qual fosse a forma ou táctica, tudo servia. Cada um desenrascava-se da melhor forma que sabia ou podia. E cada um guardava para si aquilo que conseguia amealhar, porque se serviu para uma vez, podia servir para outra. Roubar comida não era nada de mal. Entre nós, era considerado um valente e muito admirado todo aquele que conseguia comida extra. Um dia alguém conseguiu roubar o lanche do director. Fomos todos castigados duramente durante alguns tempos mas ninguém se acusou pela simples razão de que quem o fez jamais abriu a boca a não ser para se regalar com o respectivo petisco. Era assim a vida. Tudo tinha que ser feito em segredo. Se caísse na tentação de se gabar, estava completamente perdido. Como já disse anteriormente, quando entrei no Maria Pia puzeram-me na Oficina de Serralharia. A única coisa que aprendi a fazer foram chaves. Naquele tempo ainda não havia as chaves que hoje utilizamos. Eram grandes, quase todas com mais de 10 centímetros de comprimento. E pesavam. Como se pode imaginar era impossível andar com tanto peso connosco. Por isso eu guardava as chaves dentro de vários canos de esgotos. Era o local mais seguro mas muito difícil de lá chegar porque eu estava sempre com medo de que alguém me seguisse. Felizmente tal nunca aconteceu porque eu tomava muitas providências. O meu melhor truque era escalar um ou dois muros antes de pegar as chaves. Se alguém me seguisse era certo e sabido que eu via. Alguns tentaram fazê-lo mas desestiam ao segundo muro. Subir e descer muros era relativamente fácil para as crianças da nossa idade, mas eu era um escalador nato. Era muito difícil alguém conseguir acompanhar-me. Mas se alguém conseguia então era eu que desistia. Tácticas. Eu tinha tido uma boa escola, lá na terra, quando vagueava pelas ruas antes de vir para a Casa Pia. Então, acontecia que junto da cozinha, na copa onde nós lavávamos os pratos, havia uma arrecadação que só servia para guardar os pratos, as canecas e os talheres tudo de alumínio. Se por acaso havia alguém que por qualquer motivo tinha falhado uma refeição a sua comida nunca era deitada fora e muito menos se dava a alguém. Essa comida era guardada dentro dessa arrecadação. Nunca compreendi porquê mas só a deitavam fora quando começava a cheirar mal. Quando me calhava a mim a ter de lavar tantos pratos compreendi toda a mecânica e então, certo dia, resolvi fazer uma cópia desta chave. Aliás, duas chaves, porque para lá chegar tinha que passar ainda por outra porta. Felizmente o local era muito escuro e eu podia-me chegar à porta com muita facilidade. Cada chave tinha um código gravado na própria chave para eu poder identificar cada uma. Eu abria quase todas as portas dentro do asilo. Quando pretendia ir a algum lado tinha que estudar a situação dos horários, dos costumas e das pessoas que frequentávam esse local. Eu gostava muito de ler romances policiais onde se aprendiam estas técnicas. Eu actuava sempre sózinho a agia sempre premeditadamente. Para entrar na tal arrecadação onde estava a comida eu só precisava de saber se naquele dia havia lá comida. Era raro o dia em que não havia. Neste caso, eu tratei de simplificar ao máximo a minha entrada. Como todos os dias tinha fome, quase todos os dias eu lá entrava. Mas tomava as minhas cautelas. Por exemplo, jamais mexia na comida se só houvesse um prato com comida. Isso chamaria a atenção no dia seguinte. Mas quando havia 5 ou 10 pratos de comida então mais um menos um seria difícil dar por ela. Mesmo assim, eu ainda fazia outra coisa. Tirava um pouco de cada prato e ninguém dava por nada.Já imaginaram a confusão que não seria se eu viesse acompanhado? Mesmo no lado de fora da porta havia um tubo na parede meio esfolado e rôto. Com a ajuda de um arame pendurava as chaves pelo lado de dentro do tubo. Estiveram lá durante anos enquanto serviram os meus propósitos. Porque eram as chaves que mais utilizava tive que arranjar este esconderijo muito perto da porta para não perder tempo. Aquela torre que faz parte da fachada da Igreja da Madre de Deus, muito antes de ser arranjada já eu subia lá acima e guardava nela muitas chaves. Não era fácil chegar lá e penso que, pelo menos no meu tempo, não havia ninguém que lá fosse a não ser eu. Precisamente por ser difícil é que eu a considerava um esconderijo perfeito. Mesmo que o sacristão lá fosse de vez enquando não veria nada porque o buraco estava do lado contrário e visto de cima era impossível ver o buraco.
E assim ía subrevivendo.

domingo, 4 de outubro de 2009

Barcos Tradicionais do Tejo:




Barcos Tradicionais do Tejo.
Varinos e botes de fragata fazem parte da grande família de barcos do Tejo, bem como as fragatas, catraios, faluas, canoas, muletas, enviadas e botes de tartarenha, entre outros tipos de embarcações.
Consoante as suas características construtivas e a sua armação, uns destinam-se ao transporte de mercadorias e de passageiros, outros à pesca, tendo em comum uma íntima relação com as condicionantes do próprio estuário e da barra do Tejo, onde navegam e eram instrumentos de trabalho das comunidades ribeirinhas.
A marca de identidade cultural ligada ao estuário do Tejo, é sem dúvida a decoração das embarcações. Os próprios arrais ocupavam-se de manutenção do seu barco, mas em certos períodos e em ocasião de festas o artista decorava-o, criando composições com motivos naturalistas e geométricos, por vezes representando figuras de inspiração local.
Os botes de fragata, actualmente designados por Amoroso, Gaivotas e Baía do Seixal foram adquiridos e recuperados pela Câmara Municipal do Seixal. Conservados e reutilizados como barcos de recreio, tornaram-se importantes recursos culturais e promoção da actividade turística.
Lembro-me de quando se olhava para o Tejo só se viam barcos. Barcos com velas. Havia barcos por todo o lado no rio. Parecia uma avenida com muito trânsito. Hoje quando olhamos para o rio é diferente, o que não admira porque os barcos são todos diferentes de antigamente. A maior diferença que eu verifico são as velas. Ou melhor, a falta delas. Naquela época, em terra só se viam carroças, cavalos e burros e no rio também só se viam barcos à vela. E parece-me que o rei dos barcos, naquele tempo, era a fragata à vela. É dela que eu mais me recordo. O Maria Pia, dantes, não ficava muito longe do rio. Quero dizer, a distância continua a ser a mesma mas naquele tempo podiamos andar directamente para o rio. Agora temos que dar muitas voltas. Há avenidas, o caminho de ferro e o porto. Tudo isto já existia mas ninguém nos travava o caminho. Agora as avenidas estão protegidas por causa das velocidades e o porto por causa dos intrusos. Há muitos obstáculos que não havia dantes. Por vezes, saltávamos o muro e íamos até ao cais onde estavam as fragatas carregadas com amendoins que vinha das colónias. Vinham a granel. Não havia embalagens. Ainda não estava pronto para ser comercializado. Aproveitávamos enquanto os marinheiros íam almoçar. Nornalmente faziam uma fogueira e cozinhavam ali mesmo o peixinho que apanhavam pelo rio acima. Os porões estavam carregados de amendoins e uma das brincadeiras que nós mais gostávamos era dar saltos para dentro do mar de amendoins. Não íamos tanto pelos amendoins mas mais pelas brincadeiras. Até porque os amêndoins estavam crús e um amendoim crú é quease intragável. Se nós levássemos os amendoins para o asilo era preciso torrá-los e isto significava duas coisas. Tinhamos que dividir a nossa porção com os cozinheiros e estes ficavam a saber que tínhamos dado o salto. Não convinha nem uma nem outra. Por isso arrajámos uma solução. Enquanto os marinheiros comiam nós brincávamos e quando eles acabassem nós já estávamos prontos para aproveitar o borralho. Era um óptimo passeio. O grande problema era que nós nunca sabíamos quando havia amendoins. Às vezes íamos lá e as cargas das fragatas eram outras. Quando isso acontecia todos nós nos sentávamos no cais muito tristes, apreciando o navegar das fragatas, o voo das gaivotas ou ouviamos as histórias dos marinheiros mais velhos que já não podiam trabalhar mas que ainda podiam olhar as águas do rio com muitas saudades. É assim que eu me lembro do Tejo, e de tanta história ouvir, no dia da Revolução dos Cravos estava eu numa Companhia de Navegação na Av. 24 de Junho, em Lisboa, a tratar do meu primeiro embarque a bordo de um navio de cruzeiros no Mediterrâneo. O primeiro de muitos e de muitas voltas ao mundo. Embarquei em Lisboa, pela primeira vez, em 2/6/1974 no navio 'Tss Fairstar' rumo a Southampton em Inglaterra.

O Diploma da 4ª Classe da Casa Pia:

Este diploma tem passado as 'passas do Algarve'. Foi uma trabalheira para conseguir tirá-lo. Alguns anos depois de ter saído da Casa Pia houve por lá uma remodelação que atirou com os registos dos exames para outras escolas das redondezas. Quando em 1970 precisei de tirar a Carta de Condução não sabia onde estava o livro com o registo do meu exame. Na véspera de fazer exame ainda eu calcorreava Lisboa procurando. Mesmo à última da hora consegui saber que o tal livro talvez tivesse ido para a Escola da Picheleira. A Picheleira fica por detrás do Cemitério do Alto de S. João. Nunca eu tinha estado na Picheleira e para lá me desloquei. Não foi fácil. O tempo corria e eu enervava-me. Naquele tempo eram só descampados e fui encontrar a Escola num vale perdida no meio do nada. Felizmente a professora que me atendeu foi muito simpática e só a sua boa vontade é que permitiu encontrar o dito livro numa arrecadação muito desarrumada. Entreguei o diploma mesmo ao fechar da porta, mas consegui fazer o exame e passei. Depois, durante muitos anos andou perdido. Quando mudei de casa encontrei-o. Mudar de casa tem certas vantagens. Primeiro porque a gente só se apercebe do lixo que todos os dias carregamos para casa quando temos que tirar tudo, separar e jogar fora o que não interessa. Depois porque se encontram coisas de que já não nos lembrávamos e outras que nos deixam surpreendidos por ainda existirem. Foi o caso do Diploma. Encontrei-o e fiquei contente. Mais anos passaram e voltei a perder-lhe o rasto. A última vez que mudei de casa tive que deitar fora mais de 500 livros que se estragaram na cave do prédio onde morava. Felizmente lá estava o Diploma vivinho da silva. Agora, depois de reformado, aprendi a manejar um computador e tratei logo de o digitalizar. Assim já não me foge. E ajuda-me a refrescar a memória das velharias encontradas.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Os Surdos-Mudos da Casa Pia:

O Decreto n.º 1522, de 21 de Abril de 1915, modifica o regime de aceitação de surdos-mudos na Secção da Casa Pia de Lisboa para esse fim, até aí apenas destinado aos moradores na cidade de Lisboa e define a existência de um semi-internato de 30 lugares em exclusivo para alunos pobres domiciliados em Lisboa e que permite o preenchimento para lugares de internos a candidatos domiciliados noutros distritos do País que não o Porto onde existia instituição congénere. Em 10 de Maio de 1919 a instituição recebe autonomia técnica, financeira e administrativa.
Na Casa Pia de Lisboa, Sousa Carvalho acompanha e dinamiza um conjunto de experiências inovadoras, assumindo-se claramente como um adepto dos "métodos globais". Em 1929, publica Elementos de Ortofonia, que tem como subtítulo "Defeitos da voz e da palavra e o seu tratamento pedagógico nos indivíduos normais e anormais", no qual sustenta que "as perturbações de pronúncia colocam o indivíduo não só em manifesta inferioridade social e em atraso intelectual, como afectam quase sempre o seu carácter" (1929, p. 281). Por isso, "os defeituosos da pronúncia têm o direito de exigir do Estado um pouco da sua atenção para um assunto que há muito vem preocupando quase todos os países" (1929, p. 283).
Os Surdos-Mudos na Casa Pia faziam parte do nosso quotidiano. Os falantes não se davam muito bem com os surdos-mudos nem os surdos-mudos com os falantes. Mas tudo isto tinha uma razão de ser. Os surdos-mudos eram uma minoria embora fossem muitos. O ensino especial para eles era muito fraquinho. Quase que só os ensinavam a saber escrever e pouco mais. Os precetores, os professores e o pessoal do asilo tratavam tudo por igual. Não sabiam lidar com eles. Posso até dizer que os alunos falantes ainda eram quem melhor sabia lidar com eles apesar das desavenças. Quase todos nós sabiamos a linguagem gestual porque todos nós viviamos juntos e as crianças têm o dom de se adaptar e aprender tudo com relativa facilidade. Porque não conseguiam ouvir nem falar eram muito desconfiados visto que nunca sabiam o que se estava a dizer e porque todos éramos crianças as troças e brincadeiras eram constantes ao ponto de nos pegarmos. Os funcionários do asilo não sabiam a linguagem gestual excepto os professores deles mesmo assim só esses é que sabiam de maneira que quando era preciso qualquer coisa era a nós que recorriam e como nós tinhamos a faca e o queijo nas mãos moldavamos sempre a situação a nosso favor deixando-os furiosos. Por aqui se vê que as suas vidas no asilo eram muito mais complicadas. Se as nossas já eram más agora imaginem as deles.Por isso os surdos-mudos dentro do asilo eram uma minoria completamente isolada e triste. Até na igreja eles eram discriminados. Como não falavam nem ouviam a igreja recusava-se a ouvi-los em confissão mas obrigavam-nos a ir à missa como todos nós. Nós ainda 'sentíamos' o ambiente da igreja mas eles nem isso. Quando chegava a altura de sair da Casa Pia os surdos-mudos estavam melhor preparados para enfrentar a vida civil do que nós embora também tivessem muitas dificuldades. Mas tinham um método diferente. Enquanto nós podiamos ser completamente independentes desde que arranjassemos um emprego eles procuravam sempre o apoio de outros surdos-mudos que já viviam cá fora hà mais tempo. Formavam um comunidade que se ajudava mutuamente. Além disso, antes de saírem do asilo, eles procuravam especializar-se ao máximo nos seus ofícios. Sabiam que tinham que ser melhores para poderem sobreviver. Nós não ligavamos muito a isso. Alguns não ligavam, mas eu aprendi isso com os surdos-mudos. Por isso me apliquei na Escola de Hotelaria que vinha aí...

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Querer Estudar na Casa Pia:

Quando eu tinha uns cinco anos deve ter sido por essa altura que começei a querer aprender a ler. Tanto que consegui ir aprendendo mesmo sem ir à escola. O meu irmão tinha uma madrinha que era "ama". E cuidava de uma catrefa de miúdos para amealhar mais uns cobres. A Dª Fernanda, era a sua graça, tinha por marido um homem conhecido por "Pichelau", era a sua alcunha, mas para nós era o Sr. Manel. Eram duas pessoas com um coração do tamanho do mundo. Estas duas pessoas sempre me encentivaram a aprender a ler e escrever. Não se limitavam a encorajar-me. Eles começaram a ensinar-me. Como a Dª Fernando tinha uma espécie de "creche", cuidava de crianças de várias idades, eu era mais um. Para entreter aquela malta toda e também para os conseguir manter ocupados ela ensinava toda a gente a ler e escrever com a ajuda do marido. Eu nunca andei na 1ª classe. Eu era filho da rua, embora tivesse família não era fácil controlarem-me, quanto mais tempo passasse nas ruas menos incomodava em casa. Mas eu tinha um fraco pela casa da Dª Fernanda. Eu não fazia parte da sua "creche". Eu era apenas um amigo e irmão do seu afilhado. Lá, eu acalmava porque gostava de aprender. Então começei a passar lá muito tempo. Mas éramos muito pobres. O meu pai morreu com 33 anos devido a tubercolose arranjada numa oficina de tipografia. O meu pai era compositor-tipógrafo e trabalhava à porta fechada como todos os outros. Naquele tempo as tintas eram muito tóxicas e só depois de morrer o 3º é que foi permitido abrir as janelas. A minha mãe viu-se com 5 filhos nos braços e teve que se desfazer deles. Três deles foram aprefilhados por outras pessoas da família. Só restámos dois. O meu irmão era o mais velho e já trabalhava na mesma tipografia onde passou toda a vida. Como a mim ninguém me queria porque era um vadio, resolveram meter-me na Casa Pia. Eu tinha a condição principal para entrar na Casa Pia. Era órfão. Naquele tempo a Casa Pia era só para órfãos. Com as "cunhas" certas eu consegui entrar. E quando lá entrei perguntaram-me em que classe andava lá na terra. Como eu não era parvo e já sabia ler mais ou menos disse logo que andava na 2ª classe. E na 2ª classe me colocaram. Por isso nunca andei na 1ª classe. Mesmo assim eu já ía atrazado e não chumbando nenhum ano até à 4ª classe quando lá cheguei já não tinha idade para ir para Asilo Pina Manique, que era a única hipótse de continuar a estudar e fui parar ao Asilo Maria Pia onde só se aprendiam profissões de "ferrugem", as tais em que se tinha que sujar as mãos. Durante anos revolvi tudo para continuar a estudar e nada. Depois da 4ª classe ainda podiamos estudar mais dois anos. Chamavam-lhe Curso Complementar Primário. Eu também o fiz mas não servia de nada. Não tinha equivalência para nada. Mesmo quando fui para a tropa, numa altura em que o País estava em guerra e eram precisos muitos quadros superiores tudo era facilitado mas o meu curso não era conhecido e por isso não tinha qualquer validade. Foi quando compreendi que nos mantinham naquele curso apenas para nos manterem ocupados. Falei com toda a gente dentro da Casa Pia e ninguém estava disposto a deixar-me estudar. Todos me escorraçavam e cheguei mesmo a levar alguns pontapés no cú para se verem livres de mim. Um dia meti na cabeça que se eu podesse ser transferido para o Pina Manique então lá eu poderia estudar. Mas era impossível. Ninguém parecia interessado. Hoje cheguei à conclusão de que nunca falei com as pessoas certas o que não admira porque os verdadeiros chefes nós nunca os víamos nem sabiamos que eles existiam. Para nós só havia um director e que nós pensávamos que era o mais alto cargo dentro do asilo afinal não passava apenas de um chefe de serviços. Só muitos anos mais tarde é que vim a saber o que era um Provedor. É que nós nunca o víamos. Entrava de carro, enfiava-se no gabinete fora da nossa zona de circulação e saía de carro. O seu carro era o único automóvel que entrava dentro do Maria Pia. Mas mantinham-no sempre fora do nosso alcance mas não da nossa vista pelo que era muito apreciado por nós porque era um motivo de mistério. Naquele tempo automóveis não faziam parte da nossa visão. O máximo era a camioneta que trazia os víveres do mercado ou o velho autocarro. Nada mais. Das poucas janelas que davam para a rua pouco se via porque naquele tempo imperavam as carroças e cavalos, raramente se via um automóvel. O tempo foi passando e eu não conseguia estudar de maneira nenhuma. Até que um dia abriu em Lisboa a primeira Escola Hoteleira...